Por uma série de artigos e questionamentos, tenho sido confrontada com a questão primeira de que coaching não é terapia.
Bem, coaching não é terapia por uma série de razões técnicas, mas isto não significa que a dupla Coach-Coachee não produza resultados terapêuticos.
Há relacionamentos tóxicos que envenenam e adoecem e há relacionamentos que são curativos, promovem a verdadeira autonomia e por isto talvez possam ser chamados de terapêuticos.
Neste sentido, se um bom laço de trabalho for possível entre Coach e Coachee, mesmo que se atenha o foco no presente, mesmo que haja meta-competência para ser desenvolvida e mesmo que o trabalho tenha objetivos específicos a serem atingidos, ainda assim, é possível que o benefício do trabalho alcance proporções terapêuticas.
Hoje é possível afirmar que vivemos numa cultura da “terapia,” talvez porque estejamos mesmo transferindo para mãos da ciência deificada a responsabilidade da cura.
Então ocorre um círculo vicioso de alienação de si. Primeiro ocorre a vitimização: a empresa suga, o chefe maltrata e os relacionamentos não correspondem. Depois há sempre uma pílula mágica que re-energiza e traz “potência” para relacionamentos baseados em avaliações e envolvimentos superficiais e vínculos frouxos.
Acontece que o trabalho de coaching é conduzido com base na aliança e é esta que pode produzir efeitos terapêuticos. Não é objeto nem foco do coaching, mas pode ser uma consequência do trabalho sério e simétrico onde o sucesso do Coachee representa também o sucesso do Coach e por isto o processo de coaching pode ser mais ameno que o psicoterápico e ainda assim, produzir resultados satisfatórios.
Deste modo, também um laço de amizade verdadeiro, um amor generoso, um vínculo profundo podem transformar e curar.
Não é a ciência, não é a terapia, não é o coaching, mas é uma capacidade humana de formar vínculos sociais íntegros que nos dá a possibilidade de viver como sujeitos, donos da ação, mas que precisa do olhar do outro, porque é neste outro que nos (re) conhecemos.
Se parte dos sintomas que vemos hoje pudesse ser encarada como dificuldades humanas e assim desafios comuns à nossa condição, por natureza limitada e frágil, poderíamos transformar ainda mais a nós mesmos e o mundo. Porém ainda somos impressionantemente capazes de transformar a natureza, o meio e produzir, porque somos seres culturais. Produzimos arte, literatura, cinema, religião, ciência, empresas, conhecimento porque podemos modificar a natureza.
Ocorre que esta dimensão transformadora e criativa do humano se perde quando responsabilizamos os outros por nossa felicidade ou sucesso. Nos inviabilizamos como autores e sujeitos da nossa própria vida quando elegemos a empresa, o chefe, a escola, o coordenador, o médico, o terapeuta e até mesmo o coach como àqueles que detêm maior domínio sobre nós do que nós mesmos. Para piorar, os avanços biotecnológicos podem ficar a serviço desta mesma desapropriação de nós.
O que temos então?
Sintomas. Sintomas muitas vezes medicados e um número crescente de pessoas escravizadas pelos rótulos (Depressão, TOC, Pânico, TDAH e outros), no entanto livres da responsabilidade de se viabilizarem como profissionais, estudantes, professores, pais, mães, amantes e é por isto que a ciência toma o lugar do divino, o chefe e a empresa de algozes e os professores e os pais ficam desvalidos.
O professor não precisa dar conta de um aluno na arena escolar, ele tem um coordenador, que tem um psicopedagogo, que tem um médico, que tem uma pílula e contam com pais esclarecidos e amedrontados e sentindo-se culpados se curvam e obedecem à prescrição-padrão e simplificadora, que “reduz” ao fisiológico todas as questões da vontade, da disciplina, da formação do caráter e das diferentes responsabilidades de cada um dos envolvidos.
Isto não quer dizer que por vezes é mesmo necessário medicar e socorrer clínica e psicoterapicamente as pessoas em crises agudas, de tal forma que resgatadas do caos, possam reassumir o leme de suas vidas. O que chama atenção é a ocorrência maciça disto.
Agora não dá para se escorar nas estatísticas de que os executivos estão infelizes porque os motivos que infelicitam as pessoas podem divergir de acordo com seus valores, histórico de escolhas e de vida e também de acordo com a sua capacidade de lidar com as adversidades.
No coaching, buscamos resgatar em primeiro lugar a capacidade do coachee de aperceber-se como dono de si e de suas escolhas e mais, de que há na história de vida dele uma série de repertórios comportamentais eficientes, capazes de produzir os resultados que se espera e propiciar aprendizagens que permitirão transformar sua vida de acordo com suas potencialidades e desejos, ampliando a capacidade de responder pelas consequências das escolhas que virá a fazer.