Há bastante tempo sabemos que os processos de automação podem impactar nossa saúde mental.
Frente a processos automáticos, cujo ritmo e produto independem da nossa ação, vontade e determinação, podemos nos alienar.
Em situações extremas, onde o sujeito se submete ao ritmo da máquina e ou do processo, sofremos as conseqüências desta inversão e adoecemos.
Há pouco tempo, estávamos chocados com a queda do avião da Air France, uma das aeronaves mais sofisticadas e com maior grau de automação da nossa história da aviação, mas ainda um acidente sem explicação de suas causas.
De um modo geral, podemos supor que os esforços da ciência e da tecnologia estão voltados para nos trazer mais prazer, menos esforço físico e maior longevidade.
Ocorre, porém, que há um abismo entre as capacidades e habilidades de quem as produz e a compreensão de quem as opera. A operação simplificada, isto é, sem entendimento dos mecanismos que a envolve, produz alienação, doenças e erros.
Quem, entre os que dirigem um carro com transmissão e piloto automáticos, já não se apercebeu “longe”, em divagações ou diálogos internos?
Quem, numa ação automatizada, instalada por força da aprendizagem e do hábito, não foi surpreendido pelo inesperado a exigir uma resposta não automática, que implica em elaboração cognitiva mais acurada?
O fato é que estamos cercados de aparelhos e ferramentas que nos auxiliam e confortam, no entanto sobre os quais não temos nenhum entendimento, vivendo um processo de simplificação que pode nos levar a desapropriação de nós, invertendo-se a relação Sujeito-Objeto. Assim quando um objeto define a ação do sujeito, seu ritmo de operação e o produto da ação de ambos, não há muitas alternativas de saúde mental e nos “anestesiamos”.
Já não nos surpreendemos com a nossa falta de autonomia, aliás, os prazeres fáceis nos seduzem e fugimos dos confrontos de opinião, das decisões impopulares e das responsabilidades da cidadania.
Por isto o intolerável passa a ser aceito e os escândalos corporativos e políticos se sucedem sem que nenhuma reação coloque em risco o curso dos acontecimentos e modifiquem o “status quo”.
Numa república onde os poderes constituídos são constantemente ingerenciados pelo poder executivo, temos uma ditadura.
Numa sociedade, na qual o poder público define quem sobreviverá e quem morrerá numa pandemia, como a da gripe A H1N1, temos uma ditadura e mais uma vez, não temos autonomia e liberdade de escolha.
Diante de tudo isto, exemplos de mestria e capacidade de julgamento se distanciam muito rapidamente de nós, não nos atemos à enorme diferença que uma pessoa preparada, responsável e autônoma pode fazer no mundo e em nossas vidas particulares.
Refiro-me ao herói do Rio Hudson.
O piloto Chesley Sullenberger, que fez um pouso de emergência com um avião da US Airways no rio Hudson, em Nova York, no dia 15 de Janeiro deste ano.
O Airbus A-320 pousou na água, após sofrer avarias nos motores. O avião decolou do aeroporto de La Guardia com destino a Charlotte, na Carolina do Norte. Os 155 ocupantes do avião sobreviveram.
Um milagre?
Vejam os depoimentos do piloto e de sua esposa:
“As circunstâncias determinaram que aquela tripulação experiente estava marcada para voar naquele vôo em particular, naquele dia em particular”, disse o piloto. “Mas sei que falo por toda a tripulação quando digo que estávamos simplesmente fazendo o trabalho para o qual fomos treinados.”
A mulher de Sullenberger, Lorrie, disse que sempre soube que o marido “era um piloto exemplar”. “Eu sabia qual seria o resultado naquele dia porque eu conheço meu marido.”
Donas de si, preparadas e maduras as pessoas podem fazer escolhas livres e dirigir os rumos de suas vidas para a realização de seus propósitos.
Não há atalho, nem caminho fácil para e excelência ou realização pessoal. Existe esforço dedicado para a habilitação, foco da atenção, concentração e ação coordenada, consistentes com os objetivos.
Há que se dispensar enorme esforço pessoal para termos excelência, liberdade, autonomia e saúde mental.